Site do Colégio Anchieta (http://www.colegioanchieta-ba.com.br): Entrevista com a psicóloga Vanessa Ribeiro
A Dra. Vanessa Ribeiro volta a nossa seção de entrevistas para esclarecer as dúvidas de pais e alunos sobre os transtornos alimentares na adolescência. O assunto, que merece destaque, tem preocupado os médicos e educadores pela relação com doenças sérias como anorexia, bulimia e compulsão alimentar, que podem até levar à morte.
Anchieta: O que são transtornos alimentares?
Vanessa: Os transtornos alimentares são perturbações do comportamento alimentar que afetam, em especial, adolescentes e adultos jovens acarretando o aumento da morbidade e mortalidade. O DSM-IV (Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais) categoriza os transtornos alimentares em dois tipos: Anorexia Nervosa e Bulimia Nervosa. Contudo, na próxima edição do DSM, pretende-se incluir o Transtorno da Compulsão Alimentar Periódica na categoria dos transtornos alimentares. Na edição atual (DSM-IV), este transtorno ocorre no apêndice.
Anchieta: Quais transtornos alimentares mais comuns entre os adolescentes?
Vanessa: A Bulimia e a anorexia.
Anchieta: Quais são as principais causas dos transtornos alimentares em adolescentes?
Vanessa: A etiologia dos transtornos alimentares pressupõe a interação de vários fatores: os individuais, como traços de personalidade, história de transtornos psiquiátricos, alterações biológicas e experiências traumáticas; os fatores familiares, como a herança genética e o padrão de interação familiar; e os fatores socioculturais, como a cultura da magreza, a corpolatria, o consumismo.
Anchieta: A obesidade, ela faz parte desse grupo de doenças?
Vanessa: A obesidade ainda não consta no DSM e também não é considerada um transtorno alimentar. A justificativa sustentava-se, até pouco tempo, na ideia de que não era possível estabelecer com consistência a participação de fatores psicológicos nessa síndrome. Contudo, os estudos e pesquisas sobre o tema têm mostrado que tal justificativa não é válida. Acredita-se que, a partir de 2012/13, a obesidade seja incluída na categoria de transtornos alimentares no DSM-V.
Anchieta: Quando é que comer vira compulsão?
Vanessa: A compulsão alimentar refere-se à ingestão de grande quantidade de alimento em um período de tempo delimitado, seguido da sensação de perda de controle sobre o que se come e a sua quantidade. O comer compulsivo não tem relação com estar ou não com fome.
Anchieta:Quais os fatores que levam um adolescente à obesidade?
Vanessa: Assim como os transtornos alimentares, a obesidade tem caráter multifatorial. Envolve o metabolismo, as questões endócrinas, a genética, o consumo alimentar, o contexto sociocultural e os aspectos psicológicos do indivíduo, seja ele adolescente ou não.
Anchieta: Um regime pode causar um transtorno alimentar?
Vanessa: O regime não é suficiente para provocar um transtorno alimentar. Como já foi dito, é necessário a interação de vários fatores. Todavia, os regimes são considerados fatores precipitantes dos transtornos alimentares, ou seja, fatores que caracterizam o surgimento dos sintomas. A ocorrência de regimes e sua frequência servem de alerta para maior investigação.
Anchieta: Quais as diferenças entre bulimia e anorexia?
Vanessa: Tanto a anorexia quanto a bulimia se caracterizam pela preocupação patológica com o corpo, excessiva auto-avaliação e distorção da imagem corporal. Na anorexia, o peso corporal encontra-se abaixo do mínimo considerado adequado (IMC < 17), o que não é comum na bulimia. Nesta última, há episódios de compulsão alimentar com sentimento de culpa e vergonha, o que não acontece na anorexia, e utilização ou não de métodos compensatórios ou purgativos.
Anchieta: Por que a bulimia e a anorexia encontram presas fáceis na juventude?
Vanessa: A adolescência é um período de mudanças no corpo e na relação com os pais e com o mundo externo, o que por si só gera uma fragilização psíquica. Soma-se a isso o contexto sociológico atual, caracterizado pelo prolongamento da adolescência, com a consequente ampliação da dependência afetiva e diluição dos limites e valores, e pela dificuldade ou impossibilidade de subjetivação, que gera um mundo imerso na ação e na imagem onde o corpo torna-se alvo das patologias.
Anchieta: Quando desconfiar que o adolescente está sofrendo de bulimia ou anorexia?
Vanessa: Alguns fatores podem servir de indicativos: dietas e jejuns recorrentes, hábitos alimentares inadequados, exercícios demasiados, distorções de imagem corporal, preocupação patológica com o corpo, mudanças bruscas no peso corporal, humor depressivo, entre outros. Contudo, é preciso a avaliação de um profissional visto que, no nosso contexto atual, o culto ao corpo é peculiar.
Anchieta: Quais as consequências da anorexia e bulimia para a saúde do jovem?
Vanessa: Esses transtornos resultam na perda da qualidade de vida devido às diversas alterações psicológicas e fisiológicas decorrentes como: problemas cardíacos, hipertensão arterial, cálculos renais, úlceras na garganta e no estômago, alterações ósseas e do crescimento, amenorréia (ausência de menstruação), infertilidade, anemia, queda de cabelo, cáries dentárias, constipação, catarata, alterações neurológicas, fadiga, isolamento social, irritabilidade, depressão, ansiedade, comportamentos obsessivos etc.
Anchieta: Qual o tratamento indicado para pessoas com transtorno alimentar? Existe um tratamento específico para adolescentes?
Vanessa: O tratamento interdisciplinar é o mais indicado. Envolve o tratamento psicoterápico, médico e nutricional. Especialmente no caso dos adolescentes, é fundamental a intervenção familiar. Vale ressaltar que todo o tratamento deve permitir a emergência do sujeito e a subjetivação do seu sofrimento.
Anchieta:Qual é o maior desafio em relação ao tratamento?
Vanessa: Tanto a busca, quanto a adesão ao tratamento por parte do paciente com esses transtornos são difíceis. Pacientes com anorexia não costumam procurar ajuda profissional espontaneamente, ao contrário dos pacientes com bulimia que tendem a buscar tratamento devido ao sentimento de culpa e fracasso que os primeiros não apresentam. Todavia, ambos costumam se opor às intervenções propostas. É preciso que o profissional estabeleça uma relação de confiança com o paciente, fazendo que o mesmo se disponha a ir aos encontros. Também é recomendado que o profissional (que manteve o primeiro contato) tenha cautela para encaminhar o paciente a outros profissionais. O encaminhamento precoce pode fazer com que o paciente abandone o tratamento. O investimento em políticas públicas também é fundamental. No Brasil, há carência de centros/ambulatórios públicos especializados no tratamento interdisciplinar desses transtornos.
Anchieta: Qual é o papel da família no tratamento de jovens com esses transtornos?
Vanessa: A participação e implicação dos membros da família em todo tratamento é fundamental. Não adianta pensar no transtorno alimentar como um problema que só diz respeito ao adolescente. A conduta adequada da família pode contribuir tanto no alívio dos sintomas quanto na promoção de soluções mais saudáveis para o jovem. A família pode e deve buscar orientação de um profissional o quanto antes.
Anchieta: E a escola, como pode ajudar?
Vanessa: A intervenção da escola não é diretamente sobre o transtorno alimentar. A escola pode ajudar promovendo a problematização das questões referentes ao nosso contexto atual, como o padrão de beleza vigente, a influência da mídia, a busca desenfreada pelo corpo perfeito, o individualismo, o consumismo etc. Pode também discutir e promover atividades relacionadas à alimentação e à saúde, de uma forma que faça sentido para os adolescentes e não que seja imposta como um modelo a ser seguido.
Anchieta: E com relação às classes sociais, todas são atingidas pelo problema?
Vanessa: Sim. Os transtornos alimentares não são específicos de nenhuma classe social.
Anchieta: Anorexia e bulimia alimentar são mais frequentes nas meninas? Por quê?
Vanessa: Os dados apresentados até o momento indicam prevalência bem maior no sexo feminino (85 a 90%). Contudo, devemos considerar que muitas pessoas com transtornos alimentares não procuram tratamento, o que dificulta a identificação dos casos. Há também a questão cultural. A crença de que os transtornos alimentares são patologias femininas faz que os sintomas, em homens, sejam ignorados. De fato, o medo patológico de engordar, que caracteriza esse tipo de transtorno, é muito mais comum nas mulheres. O corpo feminino naturalmente acumula mais gordura que o masculino. Além disso, a exibição do corpo feminino é mais intensa, tornando-o objeto de constante observação e crítica. No homem, a preocupação com o corpo está mais relacionada ao ganho de massa muscular do que à perda de peso.
Anchieta: Qual a relação entre a depressão e o transtorno alimentar?
Vanessa: De fato, a literatura sugere que os transtornos afetivos, como a depressão, têm grande prevalência em indivíduos com transtornos alimentares. Contudo, não se pode afirmar que o transtorno alimentar leve necessariamente à depressão ou vice-versa. Existe sim, uma relação frequente de comorbidade entre tais patologias, ou seja, são patologias que tendem a estar associadas num indivíduo.
Anchieta: Estes transtornos podem interferir no desempenho escolar?
Vanessa: Interferem não só no desempenho escolar como em todos os outros âmbitos da vida do indivíduo.
Anchieta: O Transtorno alimentar pode levar à morte?
Vanessa: Com certeza! A anorexia é a patologia psiquiátrica que apresenta o maior índice de mortalidade. Em geral, a mortalidade na anorexia deve-se mais a complicações e agravamento do quadro e na bulimia deve-se mais ao suicídio.
Anchieta: O que a adolescente ou o adolescente deve fazer ao descobrir que sofre de transtorno alimentar?
Vanessa: Procurar ajuda de um profissional o mais rápido possível.
Mais informações com a Dra. Vanessa Ribeiro na Clínica Desenvolver: Psicologia, Psicanálise e Educação – (71) 3354-1424
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